Uns Troço do Só Mascarenhas. Mas que título intrigante, prosaico e , ao mesmo tempo, misterioso o desse livro. Não é? Nada muito diferente, todavia, se considerando que tal nome vem da mente de um sujeito, no mínimo, incomum: Carlos Carneiro.
Sinto-me, na verdade, sendo uma “pequena parte” de Uns Troço do Só Mascarenhas. Poderia dizer, até mesmo, que tenho uns cinco por cento, mais ou menos, de Só Mascarenhas a correr em minhas veias. Explico: quando ainda eu residia em Brasília “meti” uma violenta pilha no Carlinhos Carneiro para que, de uma vez por todas, ele trouxesse à vida “Só Mascarenhas” (seu alter ego/heterônimo/duplo/reencarnação – seja lá o que for, embora nada disso importe). Importa, na realidade, que esse livro é simplesmente – evocando a expressão mais jovem-porto-alegrense – “muito afudê”. É também, sim, uma obra “sem igual”. E outra: não tem absolutamente nada daquilo que, cada vez mais comumente, vemos, ou melhor, lemos nos escritos de nossos contemporâneos autores.
Nada, por exemplo, de tramas vividas ao Sul da França, graças a Deus. Daquelas, tipo assim, em que o personagem experimenta as “melhores trufas do mundo” enquanto, incuravelmente depressivo, descobre por lá um amor que não dá e que nunca dará certo – e sofre... Nada dessa já para lá de obsessivamente cansativa coisa que adoram chamar de “literatura pop”. Daquele modelo em que o escritor intimamente se compraz (quase se acomete de turgescências, que, além de sinônimo para “orgasmo”, é uma palavra mil vezes mais bonita) citando, recitando e ressoando o quanto Radiohead mudou sua vida. Ou, então, que Queens of the Stone Age e Foo Fighters “isso e aquilo”: o velho blá-blá-blá de sempre. Igualmente nenhum resquício da chatéssima “prosa moderna brasileira” atual, que, feito exceções, é um verdadeiro porre de cointreau sabor laranja. Um dia experimente tomar uma borracheira desse troço para ver o quão a ressaca do bagulho é islâmica.
Mas um lance que, de verdade, muito me chamou atenção nessa jogada Carlos Carneiro/Só Mascarenhas, nesse livro, coincidentemente tem ver com aquela que foi uma das melhores leituras que andei fazendo nesses últimos tempos. Chama-se, o livro, O Mesmo Homem (Difel). David Lebedoff, o autor, mostra por “a+b"" – munido de um arsenal de surpreendentes justificativas –, que, segundo ele, os escritores ingleses George Orwell (A Revolução dos Bichos, 1984) e Evelyn Waugh (Memórias de Brideshead) partilhavam entre si uma série de surpreendentes coincidências que o leigo leitor jamais poderia supor ou imaginar. Ambos os escritores por toda vida cultivaram (e disseminaram), sem abrir mão, duras convicções sobre o preceito de “certo e errado” e, de corpo, alma, cérebro e, sobretudo, com as próprias vidas devotaram-se à tão cara causa da liberdade individual. (Orwell e Waugh, embora contemporâneos e conterrâneos, nunca vieram a se conhecer, o que é mais louco).
Parece uma viagem demasiadamente “intelectualóide” toda essa minha digressão, mas uma semelhante relação procede, sim, entre nossos dois personagens (Só, faça-se saber, afirma que Carlinhos Carneiro é seu “parapsicógrafo” e, por meio dessa habilidade, guiou-lhe na escrita de Uns Troço do Só Mascarenhas). Isso é o que o leitor inevitavelmente descobrirá lendo o livro. Só Mascarenhas “ganhou vida” pela primeira vez quando, em meados dos 90’s, escreveu para a Revista ZE. Mascarenhas responsabilizava-se pela coluna “Prepúcios Texticulares” – consistia em parágrafos ou mini-textos que fofocavam sobre a vida de pessoas que existiam ou não. Mais tarde, têm-se notícias, largou tudo para dedicar-se exclusivamente a sua cobiçada coleção de moedas – a qual inclui, entre outras preciosidades, uma “Pataca Imperial” cujo valor, dizem, é inestimável.
E assim ele próprio se define: “Só Mascarenhas vive na fronteira entre o Brasil e o Uruguai, entre o real e o imaginário, entre a caturrita e o papagaio. Ele tem uma coleção de chaveiros, e também uma de lápis – herdadas de seu avô paterno –, mas a coleção à qual ele mais se dedica é a de moedas. Esse papo das coleções, eu sei, não precisava estar aqui, não nessa parte do livro, e não sei nem se em alguma outra parte, mas ele fez questão que eu colocasse. Ele é assim. Ele chega pertinho e me pede mandando que eu faça tal ou tal coisa, escreva xis ou xis palavras, e eu tenho mais é que fazer e escrever. Quem sou eu pra dizer que não?!”.
Muitos aqui de nós estamos mais do que acostumados com o Carlinhos Carneiro pop star por causa dos quilos e mais quilos de letras-hit que compôs para a Bidê ou Balde, a sua banda. Agora, entretanto, um montão de muitos outros também terão a oportunidade de conhecer (eu e mais uns, na real, já conhecíamos sua verve há muiiito tempo...) o “Gordo Carneiro” escritor. E, numa boa, vocês todos não perdem nadinha por esperar. E o que vocês ganham esperado – querem saber? – é o garantido deleite que só a boa leitura – nesse caso divertida, anticonvencional, pop, mas sem pecha de “cultura pop” e, sobretudo, renovadora – pode proporcionar tanto aos olhos quanto ao coração. Várias leituras, na realidade, que mandam o reinante tédio literário para os raios que o partam. Mas que partam, com todo respeito, lá para as bandas de Xangai ou Jacarta.
Somente o Velho Testamento poderia melhor testificar sobre o que encontraremos nas páginas de Uns Troço do Só Mascarenhas:
“Jovem: regozija-te na tua juventude!” (Eclesiastes, versículo 11).
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